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Terça, 16 Junho 2015 21:00

Sociedade Civil é ouvida em audiência pública na Câmara dos Deputados sobre política de enfrentamento à aids

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Um dos principais debates desta manhã na Câmara foi sobre o papel da Atenção Básica na linha de cuidado às pessoas vivendo com HIV

Representantes de movimentos de pessoas vivendo com HIV/aids e de populações vulneráveis à infecção pelo vírus compareceram em peso à audiência pública da Comissão de Seguridade Social e Família, realizada nesta quinta-feira (11/6), na Câmara dos Deputados, para “debater a política de saúde para o enfrentamento das DST/aids e a importância da atenção básica na linha do cuidado” destes agravos. A audiência foi requerida pelo deputado Odorico Monteiro (PT) e também contou com a presença de outros parlamentares, governo e representantes da academia.


Compuseram a mesa – que foi presidida em revezamento por Monteiro e pelos deputados Chico D’Angelo (PT-RJ), Paulo Teixeira (PT-SP), Erika Kokay (PT-DF) - o diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, Fábio Mesquita; o secretário municipal de Saúde de Curitiba, Adriano Massuda; o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Érico Arruda; o representante do Conselho Nacional de Saúde, Carlos Duarte; e o representante do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Alexandre Grangeiro, que expuseram dados e perspectivas quanto à resposta brasileira às DST e ao HIV/aids.

Em depoimento contundente ao final da audiência, Lourdes Barreto – líder do movimento de prostitutas de maior abrangência em território nacional – lembrou aos presentes ser uma das pessoas que, ao lado de Fábio Mesquita, “começaram a luta contra a aids no país”: “Sou da época em que nem o AZT existia – e, depois, os 30 comprimidos hoje se transformaram em um só”, comemorou.
 
“O nosso Programa Nacional de DST/Aids é de primeiro mundo e consegue agregar a sociedade civil”, disse Lourdes – que é natural da Paraíba, moradora do estado do Pará, prostituta e, por tudo isso, representa talvez uma das populações mais excluídas do país. Para Lourdes, “precisamos formar novas lideranças com uma concepção de sociedade mais justa”.

Coordenador Nacional da Articulação Brasileira de Gays (ARTGAY), o ativista Léo Mendes também se manifestou a favor do Programa Nacional: “Age de má-fé quem mostra quantas pessoas estão descobrindo que têm HIV e não quantos testes eram feitos e quantos são feitos agora”, disse. Segundo Mendes, o momento político brasileiro é delicado e requer sabedoria. “Somos contra o projeto que criminaliza as pessoas com HIV: essa criminalização pode coibir o diagnóstico do HIV”, observou.

O ativista também deu voz aos movimentos de jovens com HIV presentes à audiência, uma vez que estes não puderam falar devido à intensa pauta de votação na Câmara dos Deputados, que requeria a presença dos deputados em plenário: “A sociedade civil não é uma só; é importante ouvir o que os jovens estão dizendo, tratando-os com respeito”.

Tathiane Araújo – presidente da Associação de Travestis e Transgêneros de Aracaju (Astra) – lembrou os interesses das pessoas trans: “O DDAHV tem uma política muito coesa para nossa população, mas precisamos ter ainda mais visibilidade”, disse.

Ao se referir aos representantes de governo e sociedade civil presentes, o deputado Paulo Teixeira lembrou que a resposta brasileira à aids ganha sempre com o estreitamento do diálogo entre ambos. “Acompanho o Programa de Aids desde 1994; é preciso sair desse ambiente de polarização, para que ninguém esteja 100% errado, nem 100% certo: para que todos estejamos certos, juntos”, observou.

FALA DOS CONVIDADOS – Após a abertura da sessão por Monteiro, deu-se início à rodada de apresentações dos convidados. O diretor do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais do Ministério da Saúde, Fábio Mesquita, saudou os presentes à audiência, realizada no âmbito da Comissão de Seguridade Social e Família, mas, por iniciativa de Monteiro, com o apoio da Frente Parlamentar Mista de Enfrentamento às DST/HIV/Aids.
Em sua apresentação, Mesquita ressaltou as diversas conquistas obtidas nos 30 anos da resposta brasileira à aids, destacando que o departamento se encontra na vanguarda da luta contra o agravo por nortear suas ações com base na inovação, evidência científica, diálogo com todos os atores e atuação inserida no SUS, alcançando resultados nas três esferas de enfrentamento: prevenção, diagnóstico e tratamento.
O secretário de Saúde de Curitiba, Adriano Massuda, defendeu as metas 90-90-90 da Organização da Saúde, introduzidas no Brasil pelo DDAHV, e a integração dos serviços especializados de atendimento às PVHA com a rede de atenção básica, o que já uma realidade na capital do Paraná.

A cidade já alcançou a primeira meta do 90-90-90 e tem mais de 93% da população vivendo com o HIV diagnosticada. “Ampliamos muito a testagem por meio de parcerias com a sociedade civil, o Ministério da Saúde e o CDC no projeto A Hora é Agora. É muita sorte termos o Toni Reis em Curitiba”, afirmou o secretário em relação ao militante que coordena o projeto pelo Grupo Dignidade. “Precisamos agora aumentar o número de diagnosticados em tratamento antirretroviral”, disse.

O presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia, Érico Arruda, ressaltou que o panorama atual da formação de novos infectologistas seria suficiente para atender à demanda da atual fase da epidemia brasileira de aids, concentrada em populações-chave, desde que a distribuição desses profissionais pelo território nacional fosse adequada. Ele lembrou ainda que, apenas entre os associados da SBI, apenas metade trabalham com PVHA.
Cearense, o médico destacou não ser possível comparar São Paulo com outros estados, em virtude da grande concentração de serviços especializados e médicos naquele estado em relação ao restante do país. Ele defende que boas experiências na atenção básica, como a do pronto-socorro Anastácio Magalhães, unidade básica de saúde, que atende pessoas com HIV, devem ser estudadas e reproduzidas, analisando a realidade de cada cidade.
Membro do Conselho Nacional de Saúde e falando em nome dessa entidade, Carlos Duarte, que revelou viver com o HIV há 25 anos, afirmou que é necessária a avaliação constante do SUS para ampliar o papel da atenção básica na linha de cuidado da aids.
Contudo, ele criticou a política de amplo acesso ao diagnóstico, pois, na proposta atual, as pessoas têm sido testadas e, em caso positivo, encaminhadas para serviços de atenção básica, que, em sua avaliação, são “excludentes e preconceituosos”.

Alexandre Grangeiro, da Faculdade de Medicina da USP, afirmou que a mortalidade ainda é o maior desafio para vencer a epidemia. Segundo o pesquisador, a solução da questão, contudo, “não é dar acesso (ao teste rápido), mas melhorar a qualidade da assistência”.

Segundo o sociólogo, especializado em gerenciamento da Saúde, a epidemia de aids no Brasil “tem várias Áfricas dentro de si”. Ele se referiu às grandes concentrações de aids nas populações vulneráveis ao HIV que apresentam índices de notificação em torno de 5%, bem maiores que as do restante da população.

Para estas populações, um dos principais projetos do DDAHV é o Viva Melhor Sabendo, que entrou este ano em sua segunda edição. No primeiro ano, a parceria entre o Ministério da Saúde e ONG realizou mais de 28 mil testes rápidos de HIV, sendo que 46% das pessoas testaram-se para o vírus pela primeira vez e as taxas de incidência encontradas foram maiores que as da média da população.

O deputado Chico D´Angelo, ex-gestor de Saúde, disse que a resposta brasileira à aids sempre foi de vanguarda e que a mobilização social impulsiona este papel; entretanto, entende que o gestor trabalha com limitações econômicas e políticas.

Em sua fala, a deputada Érika Kokay ressaltou que uma das próximas audiências públicas a serem organizadas pela Frente Parlamentar será sobre a laicidade do Estado. “Não é possível ter política pública de enfrentamento à aids num Estado em que a influência religiosa ainda é muito grande”, afirmou.

Também estiveram presentes à sessão os deputados Jean Wyllys (Psol-RJ) e Antônio Brito (PTB-BA).

Veja o álbum de fotos do evento: http://www.aids.gov.br/galerias/2015/58034

Fonte: http://www.aids.gov.br/noticia/2015/sociedade-civil-e-ouvida-em-audiencia-publica-na-camara-dos-deputados-sobre-politica-de